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Fermentação

Durante séculos a fermentação vem sendo utilizada na produção de vinho, vinagre, pães, cerveja e outras substâncias, e muitas questões foram levantadas acerca de sua origem.

No século XVIII se identificam vários modos de fermentação (alcoólica, acética, pútridra), mas esse conhecimento não era suficiente para a prática do setor agroalimentício que enfrentava problemas de irregularidade na qualidade da produção.

Em 1854, aos 32 anos, Louis Pasteur foi nomeado reitor da faculdade de ciências da Universidade de Lille, no norte da França, perto da fronteira com a Bélgica. Entre as tarefas de ensino e gestão universitária havia o contexto específico da indústria agroalimentícia da região, e Pasteur vai abrir mais os olhos para as questões práticas.

Lille é uma cidade industrial e Pasteur leva os alunos para conhecer as fábricas dos arredores. Nesta região, onde há muitas destilarias, Pasteur é solicitado pelo industrial Louis Bigo (1787-1876) a estudar as desigualdades na produção de álcool de beterraba.

Ele observa que a fermentação alcoólica é devida a um organismo vivo (fermento), o que o levou a afirmar o papel e a especificidade da ação dos microrganismos neste processo, até então uma proposta inédita. Desse modo, ele começa a se voltar para a biologia.

Antes de Pasteur, Antoine-Laurent Lavoisier (1743-1794) e Justus von Liebig (1803-1873) já haviam enfrentado a questão da fermentação. Pasteur estava convencido de que a simplificação de Lavoisier, ao ignorar a levedura era falsa e que, muito pelo contrário, a produção de álcool é um fenômeno tão complexo quanto um ato de natureza biológica.

Liebig não admitia que a fermentação era um fenômeno biológico. Afirmava que o fermento agia por decomposição da matéria morta. Pasteur rejeita esta teoria, pois aborda a fermentação pensando na vida.

Após alguns anos de pesquisas, Pasteur estabelece com precisão que o ácido lático das cubas de beterrabas do Sr. Bigo provém de uma contaminação de leveduras e propõe o seguinte procedimento: o aquecimento para destruir a levedura lática e o repique para produzir a levedura alcoólica. Assim surgiram os princípios da “pasteurização”.

As reflexões advindas da introdução da biologia na compreensão da fermentação vão inicialmente mais surpreender do que convencer os contemporâneos de Pasteur.

Ao afirmar que a fermentação é um fenômeno complexo, correlato à vida, Pasteur vai ao encontro de grandes interrogações filosóficas e científicas do século XIX sobre o papel da vida.

Pasteur tinha a reputação de um cientista sério e um excelente professor, mas agora teria que adotar o papel de um tribuno. Para ousar opor-se à sombra sagrada de Lavoisier e à autoridade de Liebig no auge de sua glória, era preciso não somente ser dono de si, mas também saber argumentar e convencer.

Pasteur submete constantemente suas experiências às leis, cujos resultados e interpretações são frutos de uma experimentação rigorosa, enunciando detalhadamente os fatos estabelecidos. Ele escreve a revistas científicas e dirige-se a industriais.

Em 1860 publica uma dissertação sobre fermentação alcoólica. O tom é decisivo, por vezes, irônico. É de um cientista, mas também semelhante a um advogado. Até aquele momento, Pasteur era conhecido pelos estudos cristalográficos, e eis que surge como teórico dos fermentos. As áreas têm pouco em comum.

Pasteur observa os microorganismos no microscópio e observa variações na concentração de oxigênio. Com esta ideia em mente, imagina que a quantidade de oxigênio influi no desenvolvimento dos germes. Realiza experimentos e observa que o oxigênio contraria a vida dos chamados animálculos, quando se pensava que era indispensável à sua sobrevivência.

Ao mesmo tempo em que os observa, Pasteur os nomeia, chamando estes organismos de “anaeróbios” em oposição aos seres microscópicos que precisam de ar para sobreviver, os “aeróbios”. Nota, ainda, que alguns germes podem ter dupla capacidade, de viver com e sem oxigênio. Estas conclusões serão de grande importância para futuros progressos da Medicina.

Referências:

DEBRÉ, Patrice. Pasteur. São Paulo, SP: Scritta, 1995.

DUBOS, René J. Louis Pasteur. Barcelona, Espanha: Grijalbo, 1967a.

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